A Câmara dos Deputados aprovou na madrugada desta sexta-feira (7) o texto base da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma tributária em votação histórica. A medida está em debate no Brasil há 30 anos.
A votação aconteceu pouco depois das 1h30 da manhã, mas, apesar do horário, o quórum de deputados foi alto: em primeiro turno a proposta recebeu 382 votos a favor e 118 contra, já no segundo turno foram 375 votos a 113 a favor da reforma tributária.
Por ser uma Proposta de Emenda à Constituição, o texto é votado em dois turnos na Câmara dos Deputados e precisa de, pelo menos, 308 votos a favor em cada um deles para o avanço da PEC.
A sessão no plenário da Câmara começou às 11h de quinta-feira (6), com debates relacionados ao texto da proposta. Por volta das 18h, foi iniciada a sessão. O Partido Liberal (PL) entrou com um requerimento para adiar a votação, mas foi derrubado pelos parlamentares por 357 votos a 133.
A Câmara dos Deputados encerrou a sessão antes da votação em segundo turno e transferiu a votação dos destaques (mudanças) ao texto da reforma tributária para esta sexta-feira (7), às 10h. Somente depois de concluída esta etapa é que a proposta poderá ser enviada ao Senado Federal.
A proposta atual de reforma tributária pretende fazer com que o modelo de tributos no Brasil seja mais transparente. Cinco impostos devem ser extintos. No lugar, serão criados dois: o IVA, sobre Bens e Serviços, e a CBS, Contribuição sobre Bens e Serviços.
O que muda
As mudanças não são imediatas. A partir de 2026 é que haverá a unificação dos impostos. Os atuais só devem desaparecer e dar lugar ao IVA em 2033. Com a primeira fase de simplificação, a economia deve crescer 2,4% a mais, segundo o Instituto de Pesquisa Aplicada, o IPEA. A cobrança do imposto no destino, que acaba com a guerra fiscal, tem transição mais longa, 50 anos.
Rodrigo Orair, secretário de reforma da Fazenda, explica a situação: “Você tem essa tributação invisível que vai incidindo ao longo da cadeia, a gente quer acabar com ela e transformar ela muito mais visível”.
A base da reforma é a substituição de três impostos federais: o IPI, PIS e COFINS, além do ICMS dos estados e o ISS dos municípios. Todos estes serão transformados em um IVA DUAL. O CBS fica com a União e o IBS será dividido entre governadores e prefeitos.
Conselho Federativo
Como adiantado nessa quarta-feira (5) pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o Conselho Federativo, encarregado de gerir o IBS, terá o modelo de votação alterado. O conselho será formado por 27 representantes, um de cada unidade da Federação, mais 27 representantes dos municípios. Dos representantes municipais, 14 serão eleitos por maioria de votos igualitários entre os entes e 13 com base no tamanho da população.
As decisões do conselho só serão aprovadas caso obtenham, ao mesmo tempo, votos da maioria numérica dos estados e dos representantes que correspondam a mais de 60% da população do país. Os votos dos municípios serão apurados com base na maioria absoluta.
Imposto seletivo
A versão final do relatório modificou o Imposto Seletivo, que será cobrado sobre bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, como cigarros, bebidas alcoólicas e bebidas e alimentos com excesso de açúcar. Esse imposto não poderá ser cobrado sobre itens que paguem IVA reduzido.
A medida evita que o Imposto Seletivo incida sobre itens da agropecuária que seriam prejudiciais ao meio ambiente, como agrotóxicos e defensivos agrícolas. A mudança havia sido pedida pela Frente Parlamentar do Agronegócio como condição para aprovar a reforma tributária.
O PSOL apresentou destaque para derrubar a mudança, mas o governo argumentou que discutirá, em uma lei complementar, o detalhamento dos insumos agrícolas. Isso permitiria, em tese, a cobrança do Imposto Seletivo sobre agrotóxicos e defensivos.
Fundo regional
Criado para estimular o desenvolvimento de estados que não poderão mais recorrer à guerra fiscal (reduções de impostos locais) para atraírem investimentos, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional foi mantido em R$ 40 bilhões. Diversos estados pediam aportes maiores, de R$ 75 bilhões. A nova versão do relatório, no entanto, não trouxe os critérios para a divisão dos recursos do fundo entre os estados. O tema será definido após a reforma tributária.
Para conseguir o apoio da bancada do Amazonas à reforma tributária, o relator ajustou os artigos relativos à Zona Franca de Manaus e às Zonas de Processamento de Exportação (ZPE) para tornar mais claro o tratamento diferenciado e a vantagem das empresas instaladas nessas áreas.
Cashback e heranças
O parecer final informou que o cashback (devolução parcial de impostos) terá como base a redução de desigualdade de renda, em vez da diminuição da desigualdade de raça e de gênero. A mudança atende a reinvindicações de parlamentares conservadores, que ameaçaram não votar a favor da reforma tributária caso a expressão não fosse retirada.
O cashback institui a possibilidade de devolução ampla de parte do IBS e da CBS a pessoas físicas. A ideia inicial do grupo de trabalho da Câmara que discutiu a reforma tributária era incluir na proposta de emenda à Constituição um mecanismo de devolução a famílias de baixa renda, semelhante ao existente em alguns estados. As condições de ressarcimento serão definidas por meio de lei complementar.
Em relação às heranças, o novo relatório isentou do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) as transmissões para entidades sem fins lucrativos com finalidade de relevância pública e social, inclusive as organizações assistenciais e beneficentes de entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos. Uma lei complementar definirá as condições para essas isenções. A progressividade (alíquotas mais altas para heranças maiores) foi mantida.