Rock in Rio: 14 pessoas em condições análogas à escravidão foram resgatadas no festival

A informação foi divulgada nesta quarta-feira (18) pelo Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro

Por Maria Eduarda Vieira

Rock in Rio: 14 pessoas em condições análogas à escravidão foram resgatadas no festival
Eles foram encontrados dormindo na base da empresa
Auditoria Fiscal do Trabalho

Catorze pessoas em condições de trabalho análogas à escravidão foram resgatadas durante a edição deste ano do Rock in Rio. A informação foi divulgada nesta quarta-feira (18) pelo Ministério Público do Trabalho no Rio de Janeiro e a Auditoria Fiscal do Trabalho, do Ministério do Trabalho e Emprego. A operação foi realizada no dia 22 de setembro, último dia do festival.

As vítimas trabalhavam como carregadores de objetos, como grades, brindes e estruturas metálicas, e também atuavam na montagem e limpeza de alguns espaços.

Eles foram encontrados dormindo na base da empresa, deitados precariamente sobre papelões, sacos plásticos e lonas. Alguns estavam com cobertores, demonstrando que havia um planejamento prévio para pernoitar no local. Além disso, não havia chuveiro.  

Os funcionários utilizavam o banheiro do andar inferior da Arena de Tênis do Parque Olímpico. De acordo com o MPT, o vestiários estavam sujos, com muitas roupas penduradas e urina no chão.

Ainda segundo o MPT, algumas das trabalhadoras resgatadas informaram que tomavam banho de canequinha no banheiro feminino e tiravam a maçaneta da porta do sanitário para que os homens não entrassem no local.

Os trabalhadores foram contratados com a promessa de receber diárias que variavam entre R$ 90 e R$ 150, dependendo do número de horas trabalhadas. O menor valor era pago nas jornadas de 8h às 17h. Caso trabalhassem até às 5h, o pagamento era mais alto. Com isso, na expectativa de aumentar os ganhos, os empregados dobravam jornadas por dias seguidos, chegando a trabalhar por 21 horas em um dia e voltando ao serviço após três horas de descanso.

Apesar da promessa de remuneração, os valores não foram pagos integralmente.

O procurador do trabalho, Thiago Gurjão, afirma que as condições encontradas são incompatíveis com a dignidade humana.


As condições, tal como aconteceram, em que pessoas trabalhadoras são tratadas de maneira absolutamente incompatível com a dignidade humana, e é disso que se trata, né? Pessoas têm que ser tratadas como pessoas. Permanecer nesse local, nem um animal, talvez, né? Devesse estar. Então, pessoas submetidas à jornada de trabalho de 20 horas, 21 horas, um trabalho pesado, depois ser dado a elas, um chão, com um papelão, uma lona de plástico, isso não é tratar alguém como pessoa. E por essa razão, isso é trabalho em condições análogas às de escravos.

A Rock World, responsável pela organização do evento, e a FBC Backstage Eventos, contratada para a realização do serviço, foram autuadas. De acordo com o Ministerio Público do Trabalho do Rio de Janeiro, as empresas não quiseram firmar termo de ajustamento de conduta.

Com isso, o órgão vai adotar medidas cabíveis para impedir que as irregularidades constatadas voltem a ocorrer e também para garantir a necessária indenização por danos morais individuais às vítimas, além de indenização por danos morais coletivos. Como primeira medida, o MPT requisitou informações à empresa que emitiu o certificado de "evento sustentável" para o Rock in Rio, e cobrou quais providências serão adotadas a partir da constatação de trabalho escravo na edição de 2024.

Essa é a terceira vez que trabalhadores são encontrados em condições análogas à escravidão no Rock in Rio. Nas edições de 2013 e 2015, 93 e 17 funcionários, respectivamente, foram resgatados em condições de trabalho análogas à escravidão em empresas que atuavam com alimentação. Nessas ocasiões, diferente deste ano, a organizadora do evento não estava envolvida.

A vice-procuradora chefe do MPT do Rio, Isabela Maul, reforça a fiscalização vai ser realizada também na próxima edição.


Então isso já vem de longo prazo e vai continuar nas próximas edições, tá? E o que a gente vê é isso, que a gente está tendo pouco retorno de melhorias, de implementos, de melhorias na organização do festival, tá? E a gente acha importante que isso seja do conhecimento de todos, porque é um festival grande que movimenta a nossa cidade, movimenta o estado, movimenta o país, e são muitos trabalhadores necessários para que o festival aconteça. A maioria das pessoas não sabe o que ocorre ali por trás, mas só via que o festival deu certo, que funcionou.

Outras irregularidades burocráticas na contratação dos trabalhadores também foram encontradas no festival, além de problemas de assédio, meio ambiente, saúde e segurança dos trabalhadores.

Em nota, a Rock World afirmou que não assinou o termo de ajustamento de conduta proposto pelo Ministério do Trabalho por não concordar com o documento. Segundo a empresa, as irregularidades apresentadas foram realizadas exclusivamente pela prestadora dos serviços, a empresa Força Bruta, e não caracterizam trabalho análogo ao escravo.

A organizadora declarou que foi surpreendida pela notícia, afirmando que o procurador do trabalho e os auditores fiscais lançaram acusações contra a empresa de forma precipitada. A Rock World disse ainda que repudia qualquer forma de trabalho análogo ao escravo e que, assim que soube dos fatos envolvendo a empresa Força Bruta, notificou a companhia e tomou as medidas cabíveis.

A reportagem da BandNews FM tenta contato com a FBC Backstage Eventos.

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