A empresa médica que iria assumir parte dos serviços de consultas e exames do efetivo da Polícia Militar do Rio por dois anos tem como sócio o filho do ex-diretor executivo da Fundação Saúde. Ao todo, o processo de contratação do Estado do Rio pode custar mais de R$ 82 milhões com dispensa de licitação.
A reportagem da BandNews FM teve acesso a documentos que mostram o processo de seleção de empresas para atender os policiais militares e dependentes através do Fundo de Saúde da Polícia Militar.
O credenciamento foi dividido em cinco blocos. Dois ficaram sob responsabilidade de duas empresas. O valor total chegou a R$ 46 milhões.
Entre os outros blocos com valores ainda indefinidos, um seria de uma empresa cujo sócio é filho do ex-presidente da Fundação Saúde, João Ricardo da Silva Pilotto. Em agosto, a Polícia Militar registrou em um ofício que a Corporação contrataria a DImagem Diagnósticos para prestar os serviços. No entanto, a empresa desistiu do credenciamento.
O ofício interno de contratação da PM é de dois meses antes da exoneração de Joao Ricardo Pilotto da Fundação Saúde.
A Dimagem Diagnóstico fica localizada em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense.
Em um contrato anterior também por serviço médico prestado, entre 2018 e 2020, os valores foram estimados em mais de R$ 810 mil. No entanto, a Dimagem recebeu cerca de R$ 460 mil sem licitação para prestar os mesmos serviços à Polícia Militar. Nesse período, João Ricardo Pilotto não estava à frente da Fundação Saúde.
No entanto, ele ainda era sócio da empresa, da qual se desligou em dezembro do ano passado. O último pagamento foi feito em 2022, quando João Ricardo Pilotto já tinha sido nomeado novamente para o cargo de diretor-executivo do órgão estadual. O valor de R$ 32 mil foi repassado pelos serviços prestado dois anos antes.
Para o advogado especialista em direito público, Gustavo Sampaio, a relação de parentesco de sócios de uma empresa com uma autoridade dentro da administração pode, a depender do caso e se a dita autoridade detiver poder decisório na escolha, representar uma possível irregularidade.
Sempre que falamos em licitações e contratos celebrados com administração pública, ou mesmo em procedimentos congêneres aos procedimentos licitatórios, aplicam-se os princípios gerais da administração. Claro que se houver uma relação de parentesco até terceiro grau entre alguém que tenha função decisória na autoridade contratante tomadora do serviço e na empresa que vier a ser contratada, nós poderemos falar em uma possível violação ao princípio da moralidade administrativa.
Para ter a aprovação para a dispensa de licitação, a PM citou o artigo que regulamenta o credenciamento de empresas para prestação de serviços.
O texto fala sobre a situação em que as contratações simultâneas são vantajosas para a Administração. O texto destaca a fluidez do valor do objeto do contrato. A Polícia afirma que não há como fixar o número de consultas e que, dessa forma, não poderia ir para licitação.
Como justificativa para a contratação das empresas, a PM destaca o "risco de colapso" do sistema de saúde da Corporação, que calcula um total de 186 mil usuários do plano de saúde.
O jornalismo da BandNews FM conversou com policiais militares, que não quiseram gravar entrevistas. Os agentes criticaram a estrutura oferecida atualmente pelo FUSPOM e ressaltaram que muitos aderiram a um plano de saúde privado para ter um melhor atendimento.
Em outro documento, a Polícia Militar cita que atualmente só consegue cobrir cerca de 86 mil consultas. O número médio de atendimentos é de 423 mil.
No entanto, o mapa de riscos do processo cita o desafio de acompanhar o consumo do objeto contratual e a estimativa de preço em descompasso com os valores praticados no mercado.
Atualmente, o sistema de saúde da PM conta um hospital geral de alta complexidade, na cidade do Rio, e um de baixa complexidade, em Niterói, na Região Metropolitana, além de seis policlínicas.
Em nota, a Polícia Militar disse que a prestação de serviços de saúde aos policiais militares e dependentes é uma prioridade absoluta do comando da corporação e que, nos últimos quatro anos, foi possível ampliar o atendimento médico e odontológico nas unidades de saúde da PM. Além disso, a corporação ressaltou que todos os contratos seguiram rigorosamente os preceitos legais e foram celebrados com o devido acompanhamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE).
Procurada, a Dimagem disse que prestou serviços à PM entre 2018 e 2020 e que, durante esse período, o faturamento real do contrato foi de R$464 mil, e não de R$800 mil. A empresa afirmou que desde 2020 não mantém contrato ativo com a Corporação e que chegou a participar do credenciamento de empresas em 2024, mas desistiu do processo.