Condenação de réus não pode mais ser feita apenas a partir do depoimento de policiais

A mudança na redação da Súmula 70 atende parcialmente a um pedido da Defensoria Público do Rio

Por Daniel Henrique

Fachada do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro
BandNews FM

A condenação de réus na Justiça do Rio de Janeiro não pode mais ser feita apenas a partir do depoimento de policiais.

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro estabeleceu, nesta segunda-feira (9), que a condenação de suspeitos em que a prova oral se restringir a oitivas de autoridades policiais é autorizada quando estiverem em coerência com as demais provas apresentadas no processo criminal.

A mudança na redação da Súmula 70 atende parcialmente a um pedido da Defensoria Público do Rio, que tentava desde 2018 o cancelamento ou revisão do texto.

Um levantamento realizado pelo órgão em parceria com o Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da UFF aponta que nos processos analisados de casos de tráfico de drogas julgados pelo TJRJ, entre 2019 e 2023, em que houve aplicação da Súmula 70, 88,76% dos condenados eram do sexo masculino e negros.

Segundo a Defensoria, o dado ilustra como a aplicação do texto contribui para reproduzir desigualdades raciais, especialmente no contexto de delitos relacionados à Lei de Drogas.

Para a pesquisadora do GENI-UFF, Luciana Fernandes, as condenações a partir de depoimentos de policiais desfavorecem ações de investigação e de planejamento de segurança pública.

A gente argumenta que a sobrevalorização da palavra dos policiais como principal prova para subsidiar as condenações, favorece essa perpetuação das políticas de segurança que são baseadas em atuação basicamente ostensiva e reativa, em detrimento do trabalho de investigação e da produção de inteligência policial. E isso contribui para a persistência de enormes desafios para a promoção de uma segurança pública cidadã. Ainda requer uma mobilização social mesmo sobre o que é a centralidade desse depoimento oral para a construção da narrativa de processos criminais.

A coordenadora de Defesa Criminal da Defensoria do Rio, defensora pública Lucia Helena de Oliveira, vê a mudança como um marco para o processo judiciário.

A gente viu um certo avanço e o significado é que nós temos um marco. Um marco que deve ser identificado como uma mudança de cultura. É preciso que haja efetivamente um olhar cuidadoso para todo o processo, para todo o conjunto probatório, para que possa trazer tranquilidade para aquelas pessoas que são julgadas, para aquelas pessoas que sofrem um processo penal, e também para o julgador. Então, a gente vê como saudável essa mudança e eu espero que efetivamente, a partir de agora, nós tenhamos decisões mais justas e que possa trazer maior segurança à nossa sociedade.

Na decisão do TJRJ sobre a mudança da súmula, o desembargador Luiz Zveiter ainda citou que a obrigatoriedade da instalação das câmeras nas viaturas e fardas policiais é uma medida positiva para que o julgador chegue o mais próximo possível da verdade dos fatos.

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