A crise envolvendo Ucrânia e Rússia é também uma disputa de narrativas. Os dois lados apresentam versões e visões diferentes do conflito.
Nas últimas semanas, uma escala na tensão entre os países colocou o mundo em alerta para a iminência de uma guerra na região. Os russos são contra a expansão da OTAN, a aliança comandada pelos Estados Unidos, para o Leste Europeu. Enquanto a Ucrânia se vê entre uma disputa que remonta a influência da época da Guerra Fria.
Segundo relatos colhidos pela BandNews FM de quem vive nos países, os dois povos concordam ao não desejarem e ao não acreditarem em uma guerra.
O brasileiro Rony de Moura já morou na Rússia e hoje vive em Kiev, capital da Ucrânia.
Ele destaca que há uma divisão nas opiniões da sociedade ucraniana, especialmente na região de Donbass, no leste do país, principal foco das tensões com os russos:
"Conheço o pessoal que está em Lugansk. A ideia é daquele território fazer parte da Rússia, mas tem gente que está lá que afirmam que são ucrânianos. Aqui, o pessoal prefere que não haja conflito".
Um dos temores da comunidade internacional é que haja uma repetição dos acontecimentos na Crimeia, ex-território ucraniano que foi anexado pela Rússia em 2014.
Rony de Moura afirma que até mesmo a perspectiva de entrada da Ucrânia na Organização do Tratado do Atlântico Norte é motivo de receio e discussões dentro do país. O eventual ingresso de Kiev na aliança militar do ocidente não é aceito pelo governo russo:
"Imagina colocar o armamento do Ocidente na fronteira com a Rússia. Não é algo muito inteligente de se fazer. O pessoal daqui tem noção disso e realmente temem que pode acontecer uma invasão".
O brasileiro Rogério Mello também mora na Ucrânia e relata que um possível confronto com a Rússia agravaria a crise ucraniana. Atualmente, muitas pessoas têm deixado o país por conta da crise econômica:
"Diariamente, bastante gente sai da Ucrânia. O que se sabe, de fato, é que só no ano passado mais de meio milhão de ucranianos saíram do País. Principalmente, para poder trabalhar e receber um salário digno para poder enviar para a família".
Segundo agências de inteligência de países do ocidente, mais de 100 mil soldados russos estão mobilizados na fronteira com a Ucrânia.
Para a brasileira Soraya Guedes Rotchev, que mora há 23 anos em Moscou, a visão de que a Rússia vai invadir o território ucraniano é fantasiosa.
Ela observa que as ações do Kremlin acontecem no sentido de proteger os interesses do país.
E que as fortes relações culturais entre russos e ucranianos tornam ainda mais improvável um confronto armado:
"Boa parte das pessoas que residem na Ucrânia são russas. Muitos casamentos entre russos e ucranianos. Não é fácil romper essas relações".
Já para o jornalista russo Vitaly Lezov, que vive em Moscou, a Rússia nem mesmo considera existir um conflito com o país vizinho.
De acordo com ele, os responsáveis pelas recentes tensões na fronteira não são os ucranianos, e sim os norte-americanos:
"Ninguém acha que a Ucrânia é uma unidade autônoma. A Ucrânia é um país dirigido pelos Estados Unidos. Acho que a maioria dos ucranianos vai concordar com isso. A Ucrânia não tem um Estado forte. Segundo a nossa agenda política, não temos conflito com a Ucrânia. Temos conflito com os Estados Unidos".
O jornalista russo ainda afirma que a comunidade internacional tem exagerado ao prever a possibilidade de uma guerra:
"Provavelmente, a apresentação na mídia deste problema é mais grave que na realidade ucraniania do que na realidade russa. Pode ser que globalmente esse assunto é mais importante do que localmente. Por exemplo, os nossos líderes de opinião pública não acham que vai ter guerra".
Apesar das críticas aos Estados Unidos e da acusação de que o governo ucraniano seria um fantoche dos norte-americanos, Vitaly Lezov acredita que o governo russo não deseja uma ruptura com a Casa Branca.
Em função da escalada nas tensões dos últimos dias, uma reunião do Conselho de Segurança da ONU foi convocada para discutir a crise.