- Conteúdo verificado: Postagem nas redes sociais, também compartilhada em aplicativos de mensagens, sugere que o governador de São Paulo, João Doria, e Fábio Luiz Lula da Silva, o Lulinha, filho do ex-presidente Lula, são sócios na empresa fabricante da vacina Coronavac, visando às eleições de 2022.
É falso o conteúdo de uma postagem no Facebook segundo a qual o governador de São Paulo, João Doria, e Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seriam sócios.
Na mensagem que circula pelo WhatsApp e por redes sociais, a sociedade entre os dois estaria relacionada à CoronaVac, vacina produzida no Brasil numa parceria entre a empresa chinesa Sinovac e o Instituto Butantan – o centro de pesquisa biomédica do governo paulista. Lulinha, segundo o texto verificado, teria destinado R$ 100 milhões para adquirir 20% das ações da empresa em troca de apoio político a Doria.
O texto cita como fonte a Polícia Federal, menciona o que seria o número do inquérito e alega que o órgão está investigando o caso.
A Sinovac está listada na Nasdaq, um dos mercados de ações baseados nos Estados Unidos, e como todas as companhias nesta condição precisa se submeter a regras de transparência a respeito de quem são seus donos. No site da Nasdaq consta a lista de empresas que possuem ações da Sinovac e nela não aparecem empresas brasileiras.
Além disso, todas as alegações foram contestadas pelas pessoas citadas durante a verificação do Comprova, a começar pela Polícia Federal, que ressalta que dados sobre operações estão disponíveis no site do órgão, e qualquer informação que tenha partido de canais não oficiais são de responsabilidade de quem faz a divulgação.
Doria e Lula negaram qualquer aliança, e ainda criticaram o que seria uma estratégia de adversários políticos.
O Comprova procurou um dos usuários que fez a publicação, mas até a divulgação desta checagem não obteve retorno. O post foi feito em uma página de apoio ao presidente Jair Bolsonaro. Tanto Doria quanto Lula são adversários políticos de Bolsonaro. Eles são, também, adversários entre si.
O conteúdo voltou a circular em abril, mas, em janeiro, a Agência Lupa já havia feito uma verificação em que apontava que era falsa mensagem de que o filho de Lula comprou 20% das ações da Sinovac.
Como verificamos?
Para verificar o conteúdo, o Comprova entrou em contato com o Departamento de Polícia Federal (DPF), ligado ao Ministério da Justiça e Segurança, solicitando informações sobre a suposta investigação reportada na postagem. A assessoria do órgão não confirma a existência de apuração sobre a compra de ações da Sinovac, fabricante da Coronavac, por Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha.
O governo de São Paulo também foi procurado para se manifestar sobre a alegação de que o governador João Doria seria sócio do filho do ex-presidente. As acusações foram refutadas pela administração estadual, à qual está vinculado o Instituto Butantan.
Lula foi questionado sobre a relação de seu filho com Doria e a suposta participação societária na Sinovac, e emitiu uma nota desmentindo qualquer envolvimento de Lulinha na empresa.
Ainda houve uma tentativa de verificação junto ao usuário do Facebook que postou o conteúdo, com o envio de mensagem pela mesma rede social que usou para a divulgação, mas ele não respondeu.
Para a checagem, também foram verificados o site da Sinovac e da Nasdaq, mercado de ações em que a empresa chinesa está listada, de modo a identificar os sócios. Entre os acionistas, nenhuma organização brasileira.
O Comprova fez esta verificação baseado em informações científicas e dados oficiais sobre o novo coronavírus e a covid-19 disponíveis no dia 7 de maio de 2021.
Verificação
Plano para eleição presidencial
O conteúdo que circula nas redes sociais faz conjecturas sobre o suposto acordo de Doria e Lulinha como um plano do governador paulista visando à eleição presidencial, em 2022.
Em um dos trechos, a mensagem diz que “uma força-tarefa da Polícia Federal descobriu que a empresa farmacêutica Sinovac Biotech, meses antes de assinar um acordo com o governo do Estado de São Paulo e o Instituto Butantan, teve 20% das ações compradas por um grupo de investidores, aqui do Brasil, cujo maior societário é Fábio Luís Lula da Silva, filho do corrupto condenado Lula.”
Os 20%, segundo a postagem, teriam sido adquiridos por R$100 milhões na época, mas já teriam alcançado a marca de R$ 1,5 bilhão.
Outro ponto afirma que houve uma tentativa de encobrir o acordo, cujo objetivo seria conquistar o apoio da esquerda ao projeto político de Doria de se eleger presidente.
“Ele ganha a eleição e o PT, que não se elege mais, ganha apoio político e também uma parte da venda das ações que o filho do Lula comprou, ou seja, esses políticos safados querem nos aplicar uma vacina vagabunda, sem eficácia alguma, e ainda lucrar em cima do povo doente, sofrido e cheio de medo.”
No contato feito com a Polícia Federal, o órgão foi questionado sobre a existência do inquérito 2022 13 45 – o número é a junção do ano da eleição e a representação dos partidos de Lula (PT/13) e Doria (PSDB/45). Também foi perguntado se há investigação sobre a sociedade do governador de São Paulo e Lulinha.
Em nota enviada por e-mail, a Polícia Federal informa que as ações e operações do órgão são divulgadas oficialmente no site. “Qualquer informação que circule nas redes sociais que não tenha partido dos nossos canais oficiais de comunicação é de total responsabilidade de quem a divulgou”, diz um trecho. Em pesquisa no site da PF, não há nenhum inquérito com o número indicado na postagem.
No site da Sinovac, não há nenhuma menção a Lulinha como sócio e, na seção de relacionamento com o investidor, a empresa ressalta que não oferece atualmente planos de compra direta de ações, uma modalidade de investimento em que uma pessoa interessada poderia adquirir os papéis da fabricante chinesa.
Já a página da Nasdaq, mercado de ações na qual se encontra a Sinovac, não inclui nenhum grupo brasileiro, como sugere a postagem do usuário do Facebook. Em outro site de avaliação desse mercado, consta que a maior participação é da 1 Globe Capital, que detém 26% das ações da Sinovac, seguida pela SAIF Advisors, com 15,2%. Há, ao todo, 10 acionistas, com cotas variadas, a partir de 1,72% de participação na Sinovac.
Do governo de São Paulo, o Comprova quis saber sobre a relação de Doria com Lulinha e, ainda, sobre a declaração de que a CoronaVac não é eficaz.
A resposta, também por nota, enfatiza que a “informação é completamente falsa” e completa:
“Esta é mais uma das inumeráveis fake news que têm o objetivo exclusivo de desinformar e confundir a população sobre as necessárias ações de combate à pandemia do coronavírus, que são adotadas pelo governo de São Paulo desde o início do ano passado”, pontua a Secretaria de Comunicação do governo paulista.
Procurado para se manifestar sobre o conteúdo divulgado ou intermediar o contato com Lulinha, o ex-presidente Lula sustenta, em nota, que ele e sua família “são vítimas há anos de mentiras divulgadas por grupos políticos adversários, que produzem as mentiras mais absurdas com objetivos político-eleitorais.”
Na avaliação do petista, são os mesmos grupos políticos que divulgam informações falsas sobre a pandemia, causando danos para a população brasileira no combate ao vírus que já matou mais de 411 mil brasileiros.
“Infelizmente, as autoridades e redes sociais fazem pouco para coibir esse comportamento nocivo para a sociedade brasileira. Lógico que o filho do ex-presidente Lula não tem relação nenhuma com a empresa que produz a vacina CoronaVac”, critica Lula, acrescentando que é importante que os brasileiros tenham acesso às vacinas para superar a pandemia.
A CoronaVac no Brasil
Produzida pela empresa de biotecnologia Sinovac, sediada na China, a Coronavac está no lote das primeiras vacinas contra a Covid-19 a serem usadas no Brasil ao lado da Astrazeneca/Oxford/Fiocruz. Em junho do ano passado, o governo de São Paulo, ao qual o Instituto Butantan é vinculado, anunciou a parceria para testes e produção do imunizante no país.
Três meses depois, Doria assinou um contrato com a companhia chinesa para transferência de tecnologia, possibilitando que o Butantan assumisse a produção para a distribuição da vacina no país. Já em dezembro, foi iniciada a fabricação do imunizante em território brasileiro.
No início de janeiro, o instituto divulgou que o resultado dos estudos apontavam para a eficácia da Coronavac, e foi solicitado à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o uso emergencial no Brasil. No mesmo dia em que o órgão aprovou a utilização, em 17 de janeiro, o governo de São Paulo deu início à campanha da vacinação, antes da data que havia sido programada pelo Ministério da Saúde, provocando novos embates entre João Doria e o governo federal.
Naquele mesmo mês, começou a circular nas redes sociais a mensagem relacionando o governador de São Paulo a Lulinha, estabelecendo uma conexão com a aquisição da Coronavac. A postagem voltou a ganhar força em abril, especialmente em compartilhamentos por aplicativos de mensagem.
Ao longo de todo o processo, a vacina esteve no centro da disputa política de Jair Bolsonaro e João Doria.
Por que investigamos?
O Comprova investiga informações suspeitas com grande alcance na internet, caso do conteúdo analisado nesta checagem. As postagens circulam no Facebook, Twitter e são compartilhadas pelo WhatsApp.
O conteúdo foi considerado suspeito porque estabeleceu uma relação comercial de duas figuras públicas, de espectros políticos distintos, sem apresentar dados confiáveis.
O Projeto Comprova verifica também conteúdos que contenham informações duvidosas sobre a Covid-19. Neste caso, a mensagem levanta suspeição sobre a vacina Coronavac, uma das opções de imunização contra a doença no Brasil, e a desinformação pode comprometer a estratégia de vacinação no país.
A Agência Lupa já fez a verificação do mesmo boato, ressaltando que Lulinha não comprou 20% das ações da Sinovac. O Estadão e o projeto Fato ou Fake, do G1, também desmentiram o conteúdo ao fazer a checagem.
Falso, para o Comprova, é todo o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.