Em entrevista exclusiva ao Pretoteca, programa da BandNews FM comandado por Larissa Alves, Ivanda Sobrinha, coordenadora da causa de enfrentamento às violências contra meninas e mulheres do Instituto Avon, trouxe à tona questões fundamentais sobre o feminicídio e como ele afeta desproporcionalmente as mulheres negras no Brasil.
Segundo ela, o feminicídio é uma morte evitável resultante de um ciclo de violência que muitas vezes começa de forma sutil e psicológica, mas que pode escalar para agressões físicas e culminar em morte.
A naturalização da violência é um dos aspectos mais alarmantes destacados pela especialista. Ela aponta que muitas mulheres crescem em ambientes violentos e, como resultado, têm dificuldade em diferenciar amor de dor em suas relações afetivas.
A mulher que cresce em um lar violento tem muito mais dificuldade de identificar o que é amor e o que é dor, explica Ivanda.
Esse contexto de aceitação e reprodução da violência cria uma situação em que o controle e o ciúme excessivo são vistos como normais, e a mulher hesita em deixar o relacionamento por medo do julgamento social e das dificuldades financeiras e logísticas.
Apesar do medo e das dificuldades, Ivanda ressalta que muitas dessas mulheres são, de fato, as provedoras de seus lares. “Nem sempre elas são tão dependentes financeiramente dos companheiros”, observa. Para ela, a dependência financeira, embora significativa, não é o único fator que mantém as mulheres em relacionamentos abusivos. A violência psicológica mina a autoestima e a capacidade de ação, mantendo a mulher presa num ciclo de violência.
Ivanda explica que a violência contra a mulher não é constante; há momentos de trégua, de promessas de mudança por parte do agressor, que confundem ainda mais a vítima e a fazem duvidar da gravidade da situação.
“Os autores dessas violências nem sempre são violentos o tempo todo. Há períodos de repactuação, promessas de melhoria, mas entre um ápice de violência e outro, esse intervalo vai se encurtando ao longo do tempo”, detalha Ivanda. Esses períodos de aparente paz reduzem gradualmente, enquanto a violência se intensifica, levando a mulher a se isolar de sua rede de apoio e aumentando o risco de feminicídio.
7 a cada 10 feminicídios no Brasil envolvem mulheres negras
A coordenadora destaca a importância do recorte racial ao discutir feminicídio. Dados de 2020 do Instituto Avon, mostram que sete em cada dez feminicídios no Brasil envolvem mulheres negras, representando 67% dos casos notificados. A discriminação racial agrava a vulnerabilidade dessas mulheres, pois muitas vezes as políticas públicas não chegam a elas a tempo.
Ivanda enfatiza que a mulher negra enfrenta maiores dificuldades para acessar serviços de proteção devido à localização periférica, falta de transporte, e necessidade de cuidar dos filhos sem apoio.
Por que as mulheres negras morrem mais? Porque nem sempre a política pública chega a tempo para essas mulheres, afirma.
“Que tal pensar em ações fora da caixinha? Capacitar agentes de saúde, que estão próximas das comunidades, para identificar e apoiar essas mulheres”, sugere Ivanda. Embora a denúncia seja crucial, ela sugere que um trabalho de conscientização e apoio psicológico pode ser igualmente vital para quebrar o ciclo de violência.
É o corpo negro o mais atingido por todas as formas de violência, e com a violência doméstica, não é diferente, conclui Ivanda.
Assista à entrevista na íntegra aqui: