É falso que a Argentina tenha revogado o direito à herança no país. Também não é verdade que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não tenha divulgado o seu plano de governo e que teria a intenção de tirar o direito à herança dos brasileiros. As duas alegações foram feitas em um vídeo divulgado no Kwai. Porém, o plano de governo é um documento que todos os candidatos são obrigados a apresentar ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Embora não tenha apresentado propostas detalhadas, a campanha apresentou diretrizes programáticas em que não há menção à herança.
Conteúdo investigado: Vídeo que circula no aplicativo Kwai mostra um texto afirmando que o presidente argentino, Alberto Fernandez, revogou o direito à herança no país. Na peça, um narrador faz críticas ao socialismo e afirma que Lula “não está mostrando seu projeto de governo” porque pretende fazer o mesmo no Brasil. “Quando morrer um pai de família, a herança vai ficar para o Estado. Viu como é maravilhoso o socialismo. Por isso que o Lula não quer mostrar o projeto de governo dele. Hoje os argentinos não têm direito à herança”, diz o narrador.
Onde foi publicado: Kwai.
Conclusão do Comprova: É falso que o presidente Alberto Fernández tenha revogado o direito à herança na Argentina, como afirma vídeo no Kwai. Também não é verdade que o ex-presidente Lula não tenha divulgado o seu plano de governo. O programa foi criticado por não trazer propostas detalhadas, mas no documento de diretrizes enviado ao TSE, não há menção a heranças. O Programa da chapa Lula-Alckmin está em um documento público disponível no site do TSE. Nele, não há nenhuma menção sobre o tema.
Diferentemente do que é afirmado na publicação, não há nenhum anúncio do governo argentino de revogação de herança no país. O que aconteceu foi uma mudança em relação ao imposto cobrado sobre a transmissão de bens. Neste ano, a Argentina mudou algumas regras de impostos, permitindo que as províncias aumentem a tributação e passem a cobrar taxas sobre heranças. Cabe a cada província decidir se irá ou não fazer a cobrança.
Para o Comprova, falso é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: A publicação alvo da checagem tinha 140 mil visualizações, quase 12 mil curtidas e 19 mil compartilhamentos no Kwai até o dia 18 de outubro de 2022.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com a página que publicou o vídeo falso. Não houve resposta.
Como verificamos: O primeiro passo foi procurar no Google por alguma notícia sobre a revogação do direito à herança na Argentina. A consulta foi feita em português e em espanhol usando a ferramenta de busca por idioma do Google. A busca só retornou resultado sobre a mudança em relação ao imposto sobre heranças. Também procuramos no site oficial do governo argentino sobre leis e normas que fossem sobre herança. Mais uma vez, só encontramos o documento sobre a mudança na legislação do imposto.
Em seguida, a equipe procurou o plano de governo de Lula no site do TSE e também entrou em contato com a assessoria de imprensa do petista. O documento foi facilmente encontrado tanto no banco de dados do Tribunal, quanto no site da campanha de Lula. Por fim, o Comprova tentou contato com o responsável pela postagem por mensagem direta no Kwai.
Alberto Fernandez não revogou direito de herança na Argentina
Não encontramos nenhuma notícia na mídia argentina sobre revogação de herança no país. O que aconteceu foi uma mudança em relação ao imposto cobrado sobre a transmissão de bens. No fim de 2021, a então secretária de Províncias do Ministério do Interior, Silvina Batakis, falou da intenção do governo de restabelecer o imposto sobre heranças na Argentina em 2022. O país não tem imposto sobre herança desde 1976. Neste ano, a Argentina mudou algumas regras de tributos no Consenso Fiscal 2022. A mudança permite que as províncias aumentem a tributação e passem a cobrar imposto sobre herança, se quiserem.
No Brasil, o imposto sobre herança já é arrecadado pelos estados, e é previsto na Constituição Federal. É o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doações (ITCMD), cobrado quando feita a transferência do bem do falecido para o herdeiro. A alíquota depende do estado, mas pode chegar a até 8%, segundo resolução do Senado. Alguns valores de herança também são isentos do imposto.
Plano de Governo de Lula é público e não fala sobre heranças
Todos os candidatos à Presidência da República são obrigados por lei a entregar o plano de governo para o TSE. Caso não o façam, ficam impedidos de concorrer nas eleições. O plano de governo da chapa Lula-Alckmin está disponível no site Divulgacand Contas, do TSE, e versa sobre “Diretrizes para o Programa de Reconstrução e Transformação do Brasil”.
Nele, os signatários assumem compromissos em áreas como saúde, educação, justiça social, inclusão, trabalho, emprego, renda e segurança alimentar. O documento também foi disponibilizado no site oficial de Lula. Ao todo, o documento conta com 121 tópicos, distribuídos em 20 páginas.
Uma pesquisa pelo termo “herança” e similares no documento em questão não traz retornos. O documento foi disponibilizado em agosto deste ano e é assinado pela Coligação Brasil da Esperança que, além do PT, conta com as seguintes legendas: PSB, PCdoB, PV, Psol, Rede, Solidariedade, Avante e Agir.
Apesar da divulgação, Lula foi criticado por só ter tornado público uma versão não detalhada do plano de governo. O cronograma inicial da campanha do petista era apresentar um outro documento de 50 páginas que especificaria melhor algumas das propostas. No entanto, de acordo com o G1, a equipe de Lula decidiu não divulgar a versão final do programa para evitar polêmicas que poderiam ser usadas contra ele.
Questionada sobre a alegação feita no vídeo checado, a assessoria de Lula informou que trata-se de “uma mentira deslavada” e acrescentou que opositores do petista “vêm inventando mentiras em série para tentar esconder o desastre social e econômico do governo Bolsonaro”.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos sobre a pandemia de covid-19, políticas públicas do governo federal e as eleições presidenciais que viralizam nas redes sociais. Publicações falsas ou enganosas envolvendo candidatos à Presidência da República, como no caso da peça alvo desta verificação, podem induzir a interpretações equivocadas sobre a realidade e influenciar eleitores no momento da votação. Os cidadãos têm o direito de basear suas escolhas em informações verdadeiras e confiáveis.
Outras checagens sobre o tema: Em verificações recentes envolvendo candidatos à presidência e representantes de outras nações, o Comprova mostrou que é falso que Lula e o presidente eleito da Colômbia queiram obrigar pessoas a dividir casa com outras famílias; que fala em apoio a Bolsonaro foi feita por jornalista argentino e não por embaixador, como afirma vídeo e que vídeo mostra pastor em encontro com Bolsonaro, e não o presidente da Coreia do Sul.