Com manifestação favorável do Ministério Público de São Paulo (MPSP), a Justiça decretou nesta quarta-feira (16) a prisão de três homens condenados em 2011 por envolvimento em um esquema de tráfico de órgãos que resultou na morte de quatro pessoas em Taubaté, no interior de São Paulo.
De acordo com as informações, os mandados de prisão foram expedidos após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que acatou tese defendida pelo Ministério Público. Os réus foram condenados a 17 anos e seis meses de reclusão em regime inicial fechado por infrações ao artigo 121 do Código Penal (homicídio).
Eles foram acusados de retirar órgãos de pacientes ainda vivos para um suposto esquema de tráfico de órgãos durante a década de 1980, enquanto atuavam em um hospital de Taubaté. As vítimas tiveram seus rins extraídos sem que houvesse a confirmação de morte encefálica.
O Caso Kalume
O caso, que ficou conhecido como “Caso Kalume” em referência ao médico Roosevelt de Sá Kalume, responsável por denunciar o esquema às autoridades, tramitou por décadas. A denúncia, feita em 1986, indicava que os réus, em busca de criar um programa de transplantes de rins na cidade, retiravam órgãos de pacientes ainda com sinais vitais, enganando suas famílias sobre o real estado de saúde dos internados. Em um dos casos, foi solicitada autorização para a doação de córneas, mas os médicos acabaram removendo ambos os rins da vítima.
Julgamento de 2011
O julgamento, que aconteceu em outubro de 2011 no Fórum de Taubaté, teve duração de mais de 40 horas. Os réus foram condenados por unanimidade pelo Tribunal do Júri, formado por quatro mulheres e três homens, sob a presidência do juiz Marco Antônio Montemór. Durante o julgamento, sete testemunhas de acusação, sete de defesa e os próprios réus foram ouvidos, além de serem exibidos vídeos e lidas cartas precatórias.
Ao final, os jurados decidiram pela condenação dos médicos, que receberam o direito de recorrer em liberdade. No entanto, em 2024, o STF decidiu pela execução imediata das penas, reafirmando a condenação em razão da gravidade dos crimes e da comprovação de que os órgãos foram retirados sem a devida comprovação de morte encefálica.
Condenação mantida em 2021
Em 2021, a 6ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a condenação dos médicos, revisando apenas a dosimetria da pena, que foi reduzida para 15 anos de reclusão. Na decisão, o desembargador Eduardo Abdalla destacou que não havia provas suficientes de que as vítimas estavam mortas no momento da extração dos órgãos, reforçando que a retirada foi realizada sem confirmação de morte cerebral.
Prisão dos envolvidos decretada
Com a decisão do STF em setembro de 2024, os mandados de prisão foram expedidos. A prisão dos condenados, mais de 40 anos após o início das investigações, marca o encerramento de um dos casos mais complexos e chocantes da história médica do país.
O que diz a defesa dos envolvidos
O Jornalismo da Band Vale procura as defesas dos três médicos acusados no Caso Kalume. Assim que o posicionamento de cada advogado for recebido, a notícia será atualizada.
Mariano Fiore Jr.
“A Defesa do Sr. Mariano Fiore Jr., em razão da decisão que decretou a prisão de todos os acusados nos autos da Ação Penal nº 0000148-39.1987.8.26.0625, impetrou o devido Habeas Corpus perante o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, alegando que a referida decisão viola princípios caros ao Estado Democrático de Direito, como o princípio da presunção absoluta de inocência, o princípio do respeito à coisa julgada e, principalmente, o princípio da irretroatividade da lei penal mais maléfica ao acusado! São por essas razões que requeremos, por meio do Habeas Corpus, a suspensão dos efeitos da decisão de primeiro grau e que a mesma não subsista em razão das ilega lidades apontadas.”
Pedro Henrique Masjuan Torrecillas
“A defesa de Pedro Henrique Masjuan Torrecillas lamenta e discorda inteiramente da decisão proferida pelo Exmo. Juiz da Vara do Júri da Comarca de Taubaté que, com base em entendimento recente adotado pelo STF, determinou a prisão dos acusados para início da execução da pena, enquanto ainda pende de julgamento recurso cujo objeto é justamente a anulação da condenação que lhe foi imposta. Sendo assim, tomará todas as medidas jurídicas cabíveis para restabelecer a garantia da presunção de inocência de seu cliente, que lhe é assegurada constitucionalmente. Por fim, deseja esclarecer que Pedro Henrique compareceu a todos os atos do processo, desde o inquérito policial até o julgamento pelo Tribunal do Júri, sempre em respeito ao Poder Judiciário e visando provar sua inocência em relação aos supostos homicídios que lhe foram injustamente atribuídos.”