Caça às bruxas: uma prática do século XV ou também do século XXI?

A fogueira ainda está acesa e queima. A caça às bruxas eclodiu no século XV, na Europa, mas até hoje elas são caçadas

Os Nós da Mente

Neste espaço você irá ter um conteúdo onde vamos discutir temas que têm tudo a ver com a sua angústia. O divã será o blog e o psicanalista é o grupo de autores que vão escrever os artigos que irão abordar filmes, livros, músicas e o cotidiano, mas tudo ligado à saúde mental. Você irá perceber que não está sozinho. Vamos dar as mãos para caminharmos na jornada do autoconhecimento. Isso porque esse é um blog de psicanálise para você!

O desejo de calar a mulher
O desejo de calar a mulher
Divulgação

Por Alessandra Zampoli, psicanalista - @alessandra_zampoli

A queimada muitas vezes é inevitável quando se é mulher. Seja por expor sua opinião, usar uma saia curta demais, levantar a voz ou pelo simples ato de dizer “não”, a mulher vive em constante ameaça.

A caça às bruxas não surgiu por acaso. Desde aquela época já era uma tentativa de controle masculino sobre as mulheres, uma mobilização focada em sufocar todos os aspectos de ser mulher e as lutas contra a cultura patriarcal e misógina.

Focado no pretexto de que as mulheres “sabiam demais” e estavam envolvidas com magia e, por isso, tornavam-se uma ameaça para a sociedade, o movimento de caça às bruxas ainda vigora, só que em outros formatos. Podemos ver diariamente nos telejornais e redes sociais notícias de perseguição e ataque às mulheres. Mais do que isso, podemos comprovar com os altos números de casos de feminicídio.

O feminicídio é um problema social e cultural grave, marcado pelo desmantelamento das políticas e dos serviços públicos de apoio às mulheres vítimas de violência por seus parceiros. Isso tem levado a números alarmantes no Brasil nos últimos anos.

A psicanálise amplia a visão sobre a problemática e pode contribuir para a compreensão desse fenômeno a partir de uma perspectiva psicológica.

Freud, o pai da psicanálise, na conferência "A feminilidade" (1933), associa o masculino e o feminino com as posições ativa e passiva, presentes nas subjetividades quer seja do homem ou da mulher. A flexibilidade para alternar entre essas posições favorece a integração destes aspectos no sujeito e torna mais provável o estabelecimento de boas relações, ou seja, todos nós temos o feminino e o masculino presentes em nossa constituição como sujeitos.

O feminicídio pode ser entendido como um ato de extrema violência, que expressa uma grande desvalorização e negação do feminino, da feminilidade e da figura feminina

A busca da submissão faz pensar em um excesso do ativo, em uma busca do controle sobre o outro, que é percebido como um objeto e não como um sujeito de desejos. 

Trata-se de uma perversão da agressividade e uma tentativa de negação do outro como sujeito desejante. Negação de seu lugar como sujeito separado e portador de desejos. 

A transformação da mulher em objeto caracteriza sua absoluta negação, o que pode inclusive se dar pelo assassinato.  

Essa desvalorização pode estar relacionada a dinâmicas inconscientes que envolvem o medo, o ódio, a inveja e o desejo de controle

A ideia aqui não é esgotar o assunto e nem tentar elencar todas as causas que levam uma pessoa a ter o desejo tão grande de controle da vida do outro, que acaba muitas vezes por extingui-la, mas sim pensar dentro do contexto do qual é importante enfatizar a necessidade de promover mudanças culturais e educacionais que valorizem a igualdade de gênero e o respeito às diferenças. 

É preciso desconstruir os estereótipos de gênero e tantos outros a fim de promover uma educação que respeite e valorize a diversidade.

A violência deve ser combatida em todas as suas formas, para isso é preciso desconstruir muitos paradigmas, a fim de que as pessoas possam se reconstruir em suas posições ativas e passivas dentro do lindo universo da subjetividade humana.