O primeiro levantamento de intenção de plantio para a safra 2023/2024 de trigo sinaliza para um novo incremento de área. As terras cobertas com lavouras de trigo devem chegar a 3,465 milhões de hectares, um avanço de 5,1% em relação aos 3,297 milhões de hectares da temporada anterior, afirmou o analista de SAFRAS & Mercado, Elcio Amarildo Bento, durante o 5o SAFRAS Agri Week, que ocorre durante os dias 21, 22 e 23 de março.
Os principais fatores apontados como motivadores para uma maior aposta no trigo são o atraso da colheita da soja, o custo de produção menor e a consequente expectativa de margens melhores devido à manutenção de preços firmes. Em regiões em que o trigo compete com o milho safrinha, o atraso da soja deixou a janela do plantio de milho apertada. Assim, muitos produtores vão optar pelo cereal de inverno.
Isso deve ocorrer no Paraná. Porém, o estado tem uma particularidade: o milho safrinha é plantado em municípios mais ao norte. Na safra passada, o milho roubou área de trigo. Neste ano, o movimento deve ser contrário. Na metade sul, onde não é possível o plantio do milho safrinha, as áreas plantadas no ano passado foram grandes, inclusive em municípios que não tem tradição em plantio. Na próxima temporada, é possível que haja um leve declínio, isso pois uma nova planta industrial deve demandar cevada a partir do final do ano. Sendo assim, esse outro cereal de inverno pode ter o plantio incentivado por contratos fechados diretamente com a indústria. A estimativa é de um aumento estadual de 4,5% na área.
No Rio Grande do Sul, os últimos anos foram muito bons em termos de preços, produtividade e qualidade. A abertura das exportações garantiu liquidez ao cereal, inclusive com negócios antecipados. Assim, os gaúchos falam em um aumento de 5% da área. A venda de semente está em bom ritmo e é mais um fator que respalda a expectativa de aumento de área.
Segundo estimativa de SAFRAS & Mercado, o potencial de produção, considerando uma produtividade dentro da normalidade e sem percalços climáticos, deve chegar a 12,07 milhões de toneladas, superando em 525 mil toneladas a safra anterior. O Rio Grande do Sul seguirá sendo o maior produtor, com um potencial de 6,250 milhões de toneladas (+4,0%), seguido pelo Paraná com 4,080 milhões de toneladas (4,6%), Santa Catarina com 473 mil toneladas (2,8%), São Paulo 455 mil toneladas, Minais Gerais 400 mil toneladas, Goiás/DF com 230 mil toneladas, Bahia com 100 mil toneladas e Mato Grosso do Sul com 82 mil toneladas. O maior temor em relação à possíveis perdas de produção é o período crítico de sensibilidade a geadas (floração e enchimento de grãos).
Com o fenômeno La Niña dando lugar ao El Niño, a expectativa é de um inverno menos rigoroso. Por outro lado, o alerta fica para a possibilidade de maior ocorrência de chuva no período da colheita. As chuvas podem não trazer grandes impactos sobre a quantidade produzida, mas afetam a qualidade, a exemplo do que aconteceu no Paraná esse ano.
“Para este ano, há um excesso de oferta no trigo russo, uma safra brasileira bastante volumosa e uma Argentina extremamente prejudicada pela estiagem”, afirma Elcio. Considerando a temporada 2022/23, foi um período de quebras significativas, especialmente na Ucrânia e Argentina. No leste europeu, as perdas foram causadas pelo conflito com os russos, que dificultou o manejo da cultura.
Ainda no final da temporada 202½022, houve dificuldade de exportar e, por conta disso, aquela safra de 33 milhões de toneladas acabou não sendo exportada em sua totalidade. Para a próxima safra, Elcio destaca que há expectativa de queda na produção da Ucrânia em praticamente metade do que foi produzido em 2021/22.
Por outro lado, também ocorreram aumentos consideráveis nessa temporada em alguns países. Segundo Elcio, a Índia está começando a colheita de uma safra que deve vir sem grandes prejuízos. A Rússia tem uma safra gigantesca e com preços muito baixos, logo após a reabertura nas exportações. O Canadá tinha um problema parecido com o da Argentina, com quebras devido ao clima, e agora recupera sua safra.
Somente na Rússia e Cazaquistão, há um aumento de 22 milhões de toneladas presentes no mercado. Se comparados com a Ucrânia, que teve perda de aproximadamente 16 milhões de toneladas, Elcio analisa que não há uma escassez global do cereal, mesmo com a expressiva quebra ucraniana. No total, a produção global de trigo aumentou 9,7%, até agora, na temporada 2022/23.
Desde 2014/15 até 2019/20, os estoques globais de trigo aumentaram, pois havia muito mais cereal produzido do que consumido. No que tange aos preços, o grande catalisador do mercado foi a guerra entre Rússia e Ucrânia. Para o analista, resta saber se os patamares de preço anteriores a guerra retornarão em algum momento.
Estados Unidos - Os Estados Unidos tem perdido sua participação no mercado internacional, mas ainda possuem suas bolsas, que são referência no mundo todo. Em relação ao abastecimento, na temporada 2018/19 o país tinha quase 30 milhões de toneladas em estoques. Em 2022/23, a expectativa são de 15,467 milhões de toneladas em estoques, segundo relatório do USDA.
Neste mesmo período, as exportações também foram reduzidas de 25,502 milhões de toneladas para 21,092 milhões de toneladas. A produção, por sua vez, decaiu de 51,306 milhões de toneladas para 44,902 milhões de toneladas. Um dos principais motivos da queda é a disputa da área do cereal com a soja e o milho, que aumentam cada vez mais no país.
A Rússia e Austrália tem preços muito baixos e isso afeta as cotações para a exportação norte-americana. Segundo Elcio, fatores que envolvem a guerra entre Rússia e Ucrânia ocasionam na queda das cotações.
De acordo com o analista, inclusive, o corredor de grãos no Mar Negro, que permite a exportação de portos ucranianos, foi renovado por 60 dias justamente pela vontade da Rússia de ver como será o cenário para a entrada da próxima safra, se será bom ou não estender novamente o acordo. A safra termina daqui a 2 meses, em maio, então já seria possível ter uma projeção para a seguinte.
Brasil - Somente o Rio Grande do Sul produziu 6 milhões de toneladas no Brasil. Se comparar com anos anteriores, a produção total do país não conseguia chegar neste volume. “O Brasil cresceu na produção e o principal fator novo para este crescimento é a exportação”, explica Elcio. “Com excedente de produção, o produtor pode vender ao preço que o mercado internacional estiver pagando”, complementa.
Elcio ressalta que o primeiro impacto deste cenário é que o Brasil vai importar menos, tendo em vista a fraca safra Argentina e o aumento na produção doméstica. Só haveria opções no Hemisfério norte, mas com mais custos.