Impostos sobre óleos vegetais comestíveis podem impactar preços de alimentos

Representantes do setor tentam convencer o Senado a reverter mudança na reforma tributária para evitar alta nos preços de todos os óleos comestíveis

Fábrica de óleo vegetal
Geraldo Bubiaki/AEN

Os produtores de óleos vegetais querem convencer o Senado a reverter uma mudança no projeto da Reforma Tributária, que aumenta a carga tributária sobre parte dos óleos comestíveis como o azeite, algodão, canola e girassol, coco, palma, dendê, linhaça e amendoim. O texto que trata da regulamentação da Reforma Tributária, aprovado pela Câmara dos Deputados delimitou o benefício da alíquota zero apenas à soja, babaçu e milho.

“O Projeto de Lei enviado pelo Executivo trazia o termo ‘óleos vegetais comestíveis’, o que abrangia todos os óleos e permitia ao consumidor ter liberdade de escolha no produto de acordo com a sua preferência e cultura regional”, explicou o presidente do Sindicato da Indústria da Extração de Óleos Vegetais e Animais e de Produtos de Cacau e Balas no Estado da Bahia (Sincaol), Hilton Lima. “Quando foi aprovado na Câmara, mudaram o texto e deixaram apenas ‘soja’, ‘milho’ e ‘babaçu’, o que causou estranheza no mercado, pois babaçu é um cosmético e a soja é quase toda destinada para a produção de combustível”, disse.

Segundo ele, o consumidor ficará restrito a apenas duas opções, embora o Brasil seja produtor de inúmeros tipos de óleos comestíveis. “Cabe ainda destacar que a mudança que estamos reivindicando não vai alterar a alíquota final, porque o consumidor vai escolher um tipo de óleo comestível”, completou.

De acordo com o economista da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (FIEB), Ricardo Kawabe, a decisão dos deputados criará uma distorção no mercado de óleos vegetais, não apenas elevando o preço ao consumidor de quase todos os óleos como na indústria alimentícia. “Podemos dar o exemplo do óleo de algodão. Ele é produzido na Bahia com ampla utilização na indústria alimentícia. Com o aumento do preço, o impacto vai ser sentido em todos os alimentos que utilizam ele como ingrediente. Isso vale para os demais óleos”, explicou. Caso prevaleça a restrição, poderá haver inclusive um aumento no preço do óleo de soja pela maior procura devido ao preço mais competitivo, o que vai impactar inclusive no preço do biodiesel”, concluiu.

A tributarista Rosany Nunes de Mello destaca que a decisão vai de encontro com a estratégia legislativa de impulsionar o estabelecimento de alíquotas mais favoráveis do IBS e da CBS para os alimentos integrantes da Cesta Básica Nacional no incentivo à alimentação saudável para o povo brasileiro e na promoção da justiça social. “Além da soja ser hoje a cultura notoriamente mais beneficiada com isenções tributárias, até mesmo como uma política de incentivo à produção de biocombustíveis, agora ela será soberana sobre todas as demais culturas de óleos vegetais comestíveis, o que é extremamente controverso pois ela está longe de ser o alimento mais saudável”, completou.

Três emendas solicitando o retorno do termo original “óleos vegetais comestíveis”, conforme determinado pela Secretaria de Receita, foram apresentadas pelos senadores Luis Carlos Heinze (PP/RS), Mecias de Jesus (Republicanos/RR) e Zequinha Marinho (Podemos/PA).

Um estudo elaborado em outubro de 2023 em parceria pela ACT Promoção da Saúde, Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) e Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) que mapeou e calculou que, no nível federal, a renúncia fiscal estimada para produção da soja no Brasil foi de R$57 bilhões em 2022, o dobro da desoneração prevista para todos os produtos da cesta básica. 

“Analisando a renúncia fiscal no âmbito dos estados, a desoneração do ICMS da soja é de quase R$8 bilhões por ano apenas em Mato Grosso. É seguro supor que outros estados produtores têm níveis de desoneração semelhantes, o que permite estimar que a desoneração dos estados pode chegar perto de R$ 25 bilhões, uma vez que Mato Grosso responde por 1/3 da produção nacional”, destaca o relatório.

O estudo argumenta que a cadeia da soja é o exemplo de uma longa trajetória de ciclos econômicos com grande concentração de renda, enorme impacto ambiental e injustificáveis privilégios. Historicamente, a política tributária, somada a outras políticas públicas, privilegiou a produção do grão em detrimento de outras alternativas necessárias à segurança alimentar da população brasileira, acarretando bilionárias renúncias fiscais e enormes custos ambientais.

Para as organizações envolvidas no levantamento, o Estado brasileiro já cumpriu seu papel em apoiar a estruturação do setor da soja e, com a reforma tributária, tem a oportunidade de repensar prioridades, considerando o enfrentamento à fome com alimentos saudáveis e produzidos de modo sustentável, bem como a necessidade de diversos outros investimentos possíveis a partir destes recursos públicos atualmente destinados ao setor produtivo da soja.
 

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