Um estudo conduzido pela Embrapa Pecuária Sudeste (SP), apontou que a pecuária leiteira pode ser menos poluente do que se imaginava. Segundo o órgão, 52 árvores por vaca, inserida nos sistemas intensivos de produção, poderiam levar a atividade à emissão zero de carbono e assim, tornar o leite “zero carbono”. O plantio de árvores é uma estratégia de compensação da emissão de gases de efeito estufa (GEEs) e pode ser usado por pecuaristas para a descarbonização. Em sistemas extensivos (baixo nível tecnológico), essa quantidade é de 33 eucaliptos.
O trabalho, divulgado na publicação internacional Frontiers in Veterinary Science, avaliou o efeito de vacas holandesas (HPB – Preto e Branco) e de jersolandas em diferentes níveis de intensificação - pastejo contínuo com baixa taxa de lotação e rotacionado irrigado com alta taxa de lotação - e a interação entre esses dois fatores na mitigação de GEEs.
No experimento, que foi realizado na Fazenda Canchim, em São Carlos (SP), foi realizado o balanço de carbono entre as emissões de GEEs, inclusive de metano - CH4 entérico, e as remoções de GEE, por meio do sequestro de carbono do solo. Essas variáveis ??foram usadas para calcular o número de árvores necessário para mitigar a emissão e o efeito poupa-terra.
Considerando apenas a raça, as jersolandas seriam mais eficientes em relação às emissões do que as holandesas, apontou o estudo. Com o plantio de 38 árvores por vaca, o produtor faz a compensação; os que utilizam a raça holandesa precisam de oito árvores a mais por vaca.
De acordo com a pesquisadora Patrícia Oliveira, a pecuária brasileira é realizada principalmente em pastagens. Dessa forma, a demanda de redução das emissões e da pegada ambiental, dá uma vantagem a mais ao País. Com bovinos criados a pasto, a necessidade de árvores para a compensação das emissões de GEEs é menor, porque na contabilização do balanço de carbono, o sequestro de carbono do solo, positivo nos dois sistemas testados, contribui na compensação das emissões.
Poupa-terra – A pesquisa ainda apontou que o efeito poupa-terra, que são tecnologias adotadas pelo setor produtivo que permitem incrementos sustentáveis na produção em uma mesma área, evitando a abertura de novas áreas para a agropecuária. “A adoção de raças adequadas e a intensificação de sistemas de produção pecuária a pasto são alternativas para otimizar o uso da terra pelo setor”, destaca.
Segundo Oliveira, os dados demonstraram que a intensificação das pastagens contribui para elevar a produção de leite e para a economia de 2,64 hectares de terra.
A taxa de lotação nesse modelo foi de cerca de sete vacas por hectare, enquanto no extensivo, apenas duas vacas por hectare. “Isso significa que é possível produzir a mesma quantidade de leite em um hectare do sistema intensivo como em 3,64 ha do extensivo. A intensificação adotada permite diminuir a pressão por desmatamento dos 2,64 ha restantes. Dentro dessa área, é possível preservar aproximadamente 145 diferentes espécies arbóreas nativas, além da manutenção de diversas espécies da fauna da Mata Atlântica”, explica.
As árvores necessárias para mitigar a emissão foram calculadas considerando o balanço de carbono dentro da porteira da fazenda. A taxa de crescimento anual e o acúmulo do gás nos troncos dos eucaliptos foram obtidos em sistemas silvipastoris próximos ao local do experimento.
Os resultados também foram promissores quanto a pegada de carbono por litro de leite (corrigido para teores de gordura e proteína), com valores inferiores a 0.5 kg de CO2 por litro de leite para todos os tratamentos avaliados.
Sustentabilidade na produção - O Brasil produz 35 bilhões de litros de leite por ano, ocupando o terceiro lugar no ranking mundial. As propriedades, a maioria de pequeno e médio porte, estão distribuídas em 98% dos municípios brasileiros, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e cerca de quatro milhões de pessoas estão envolvidas na atividade.
Mas a produtividade é baixa na maior parte das fazendas. A média de litros de leite por vaca em lactação é em torno de quatro litros ao dia no Brasil, enquanto a média mundial é próxima a 10 litros diários. “Esse cenário discrepante pode ser explicado pelo modelo de produção adotado. As gramíneas são a principal fonte de alimento para o gado leiteiro em sistemas baseados em pastagens de qualidade comprometida, que muitas vezes são manejados abaixo de sua taxa de lotação potencial, com uma média nacional de uma vaca por hectare”, complementa a pesquisadora.
O setor, além de ter a demanda de elevar a produtividade, viu aumentar nos últimos anos as expectativas dos consumidores em relação à qualidade do produto e às questões de sustentabilidade e bem-estar animal.
É crescente a preocupação com as mudanças climáticas. No Brasil, a agropecuária é responsável por 33,6% das emissões brasileiras de GEE, sendo 19% vindas da fermentação entérica. O rebanho bovino contribui com 97% das emissões de metano, sendo 86% do rebanho de corte e 11% do gado leiteiro.