Aprosoja acusa Danone de boicote à soja brasileira, mas empresa nega: "não procede"

Produtores de soja acusam multinacional de boicotar a produçaõ brasileira, envolvem o ministério e empresa diz que é mentira

Safra mundial de soja estimada em 428,7 milhões de toneladas
Wenderson Araújo/Trilux

Uma semana após Mato Grosso aprovar uma lei que retira incentivos fiscais a empresas que aderirem à Moratória da Soja, circula no Brasil a notícia de que a multinacional Danone, com sede na França, não vai mais comprar soja brasileira, direcionando as suas compras para os países asiáticos. A informação acendeu um alarme nos produtores rurais brasileiros sobre os possíveis prejuízos que a determinação pode gerar ao setor. 

Nesta terça-feira (29), a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil) divulgou uma nota oficial informando que se trata de “desconhecimento ao processo produtivo no Brasil e um ato discriminatório contra o Brasil e sua soberania”.

A Aprosoja afirmou que o boicote adotado pela multinacional francesa traz prejuízos para o Brasil e para os brasileiros, mesmo que a legislação da União Europeia anti desmatamento ainda não tenha entrado em vigor. A nova lei depende de aprovação no Parlamento Europeu, que deve prorrogar sua vigência por um ano. A decisão foi prorrogada em 12 meses.

A instituição afirma que o ato de discriminação contra a produção de grãos do Brasil é passível de reclamação por parte do governo brasileiro nas instâncias que regulam o comércio mundial, pelo seu caráter punitivo, discriminatório e coercitivo. “Nota-se que a ação da Danone está pautada na coerção da lei pela previsão de multa na hipótese de descumprimento da legislação que ainda nem entrou em vigor”, consta na nota.

No entendimento da Aprosoja Brasil, já existem elementos suficientes para que o Brasil lance mão de medidas de compensação, uma vez que há prejuízos aos produtores brasileiros e suas cadeias produtivas, com impactos concretos ao comércio internacional brasileiro.

A primeira medida seria o governo brasileiro notificar a União Europeia para que adequasse a sua legislação. O segundo passo, caso o pleito não seja atendido, seria listar os valores que a Europa teria de devolver ao Brasil em função dos prejuízos causados pela sua legislação e, em seguida, avaliar a melhor forma de buscar a compensação, o que incluiria uma reclamação junto à Organização Mundial do Comércio (OMC).

Na nota, a Aprosoja aponta que “No que se refere ao desconhecimento da Danone e de outras empresas estrangeiras em relação à sustentabilidade brasileira, o Brasil, na realidade, já está atingindo a linha de desmatamento líquido zero há bastante tempo. Embora exista desmatamento, também há muita regeneração da vegetação natural. Portanto, a afirmação de que o Brasil lidera a destruição de floresta tropical no mundo é fala de quem desconhece a dinâmica das florestas no Brasil. Pior ainda, está discriminando o único produtor de soja no mundo que preserva o meio ambiente e os recursos hídricos dentro das suas propriedades”.

Na semana passada, foi sancionada a lei nº 12.709, em Mato Grosso, principal produtor de soja do Brasil, que vai contra à Moratória da Soja, um acordo que prevê bloqueio à comercialização de soja originada em áreas de desmatamento. A lei aprovada não cita a moratória, mas incentivos fiscais a empresas agrícolas que aderirem a acordos e projetos semelhantes. 

Em nota, o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) reafirmou o compromisso ambiental do setor e à legislação vigente, bem como ressaltou o compromisso das empresas brasileiras, mas classifica como arbitrárias as regras da União Europeia. 

"Em resposta às recentes declarações e ações da Danone e de outras empresas do setor agroalimentar europeu que optaram por interromper a aquisição de soja do Brasil, o Ministério da Agricultura e Pecuária do Brasil vem a público esclarecer e reiterar os seguintes pontos:

Compromisso Ambiental e Sistema de Comando e Controle: O Brasil conta com uma das legislações ambientais mais rigorosas do mundo, apoiada por um sistema de comando e controle eficiente e respaldado por uma complexa estrutura de monitoramento e fiscalização. Esse sistema tem permitido ao país combater o desmatamento ilegal com políticas públicas que abrangem o Cerrado, a Amazônia e outras regiões sensíveis, assegurando que a produção agrícola seja feita de maneira responsável e sustentável. Os compromissos internacionais brasileiros vêm sendo reafirmados periodicamente com metas ousadas de descarbonização, redução do desmatamento e fomento à agricultura sustentável, fatos confirmados durante a presidência do Brasil no G20.

Processos de Due Diligence das Empresas Brasileiras: As empresas brasileiras atuantes no mercado de exportação de soja e outros produtos agrícolas estão em conformidade com rigorosos processos de due diligence que garantem o cumprimento das exigências de seus clientes internacionais. Esses processos refletem os esforços e os investimentos em sustentabilidade feitos pelo setor produtivo brasileiro, com modelos de rastreabilidade robustos e reconhecidos internacionalmente.

Posicionamento Sobre o Regulamento de Desmatamento da União Europeia (EUDR): O Brasil considera as normas do EUDR arbitrárias, unilaterais e punitivas, tendo em vista que desconsideram particularidades dos países produtores e impõem exigências com impactos significativos sobre os custos e a participação de pequenos produtores no mercado europeu. Estas novas diretrizes dificultam o acesso ao mercado europeu de produtos brasileiros, da América Latina e de outras origens, incluindo a Ásia, ao invés de apoiar uma transição justa e sustentável. Incentivos positivos são mais eficazes na promoção da proteção ambiental, compensando e remunerando aqueles que prestam serviços ambientais.

Soluções Brasileiras e Compromisso com a Transparência: Como parte dos esforços para atender a preocupações legítimas dos mercados consumidores, o Brasil apresentou à União Europeia propostas de modelos eletrônicos que contemplam as etapas iniciais do EUDR, demonstrando seu compromisso com uma produção rastreável e transparente. Nossos modelos privados de rastreabilidade são amplamente reconhecidos e aprovados pelos mercados europeus, o que evidencia a seriedade com que o Brasil trata a questão ambiental e a segurança de suas cadeias produtivas.

Diálogo e Cooperação Internacional : O Governo brasileiro está em diálogo contínuo com a União Europeia para alinhar práticas e estabelecer uma regulamentação que beneficie todas as partes envolvidas. Recentemente, o Brasil manifestou oficialmente sua posição e obteve resposta da União Europeia, que anunciou o adiamento da aplicação do EUDR para 2025, fato que reforça a importância das discussões bilaterais e a busca por soluções que respeitem a soberania dos países produtores.

Reiteramos que a posição do Brasil é firme quanto a não aceitar regulamentações que ignorem nossos avanços ambientais e sociais, ao impor restrições desproporcionais a produtos brasileiros.

Entendemos que essa postura influencia negativamente o comportamento de empresas comprometendo o entendimento de consumidores sobre a real dimensão da segurança alimentar baseada na produção sustentável e nas negociações internacionais, que deve ser baseada na confiança mútua e no respeito à soberania e à diversidade de soluções nacionais.

A agricultura brasileira é um pilar da sustentabilidade global e já alcança altos padrões, refletindo nosso compromisso com um comércio justo e ambientalmente responsável. Os números da agropecuária brasileira vêm sendo avaliados sob aspectos de sustentabilidade em fóruns internacionais e comparados com os demais países, demonstram um descolamento positivo em termos de ganhos de produtividade e redução de impactos negativos.

O Brasil está pronto para colaborar, mas exige ser tratado com a mesma justiça e equilíbrio que pautam as relações comerciais internacionais devendo ser rechaçadas posturas intempestivas e descabidas como anunciadas por empresas europeias, com forte presença de atividade também no mercado brasileiro.

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