A conta do supermercado está mais alta para os consumidores brasileiros e todos estão sentindo esse impacto desde meados de outubro e novembro do ano passado. Café, carnes, etanol, açúcar, frutas e hortaliças estão mais caras em todas as regiões do país. A explicação para essa alta nos preços dos alimentos, que puxa a inflação medida mês a mês através do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), é, principalmente, o clima.
Nesta sexta-feira (10), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou o IPCA medido em dezembro e apontou que o índice ficou 0,52% acima do IPCA do mês anterior. Com esse resultado, a inflação oficial do Brasil em 2024 ficou em 4,83%, percentual acima do limite máximo da meta estipulada pelo governo. Em 2023, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) havia ficado em 4,62%.
A meta de inflação do governo para 2024 era de 3%, com tolerância de 1,5 ponto percentual (p.p.) para mais ou para menos. Ou seja, o IPCA do ano ficou 0,33 p.p. acima do que o governo previa e esse resultado de 2024 é o mais alto desde 2022 (5,79%).
De acordo com o IBGE, em 2024 foram os alimentos e as bebidas que mais impactaram o bolso dos brasileiros, com alta de 7,62%, impacto de 1,63 p.p. no IPCA, e segundo o gerente da pesquisa, Fernando Gonçalves, a alta no preço dos alimentos se explica por causa da “influência de condições climáticas adversas, em vários períodos do ano e em diferentes localidades do país”.
Os destaques principais foram as carnes (20,84% e 0,52 p.p.), o café moído (39,60% e 0,15 p.p.), o leite longa vida (18,83% e 0,13 p.p.) e as frutas (12,12% e 0,14 p.p.). As carnes chegaram a ter recuos nos oito primeiros meses do ano, e passaram a subir a partir de setembro, enquanto o café registrou alta ao longo de todo o ano.
Para calcular o IPCA, o IBGE apura o comportamento de preços de 377 produtos e serviços. Além dos alimentos e bebidas, também são avaliados itens de saúde e cuidados pessoais e transportes.
Em relação aos alimentos, veja os episódios que contribuíram, em 2024, para a produção de alimentos diminuir e o preço deles, subir:
- Arroz: o final da safra de arroz foi prejudicada pelas enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul, em maio de 2024. O estado é responsável por 70% da produção nacional de arroz e as chuvas impediram a colheita do final de safra. Em 2023, o Brasil havia colhido 10,5 milhões de toneladas de arroz e em 2024, que ainda não está finalizada, já que a safra de alguns produtos agrícolas começa em um ano e termina no outro, pode cair até 7%.
Para 2025: com preços em alta, clima mais propício, muitos agricultores se animaram e optaram por plantar arroz na atual safra. Se o clima contribuir, em 2025 o Brasil deve colher mais arroz e os preços podem cair.
- Café (+39,6%): as condições climáticas que atingiram as regiões produtoras de café – Minas Gerais, São Paulo, Rondônia e Bahia – fizeram a produção cair. A prolongada estiagem de 2024 gerou um estresse hídrico nas plantas, as floradas dos cafezais foram menores e a produção também. No entanto, estes problemas climáticos não ocorreram apenas no Brasil, mas em outros países produtores de café, como o Vietanã. E, como o café é uma commodity, a produção mundial do grão interfere em seu preço.
Para 2025: Como o café é uma lavoura perene, com ciclos de produção bianuais (por questões fisiológicas, a planta produz mais em um ano e menos no outro), a tendência é que a produção continue menor e isso deve manter os preços do café elevados. Os demais países produtores também enfrentam dificuldades e, por isso, a demanda por café brasileiro no exterior deve ser alta. Além disso, o dólar valorizado frente ao Real, torna as exportações bem mais atraentes para os produtores.
- Carne bovina (+20,84%): a carne bovina, que vinha de dois anos com preços bem equilibrados, começou a subir novamente. Isso é explicado porque, no campo, o número de animais prontos para o abate (gordos o suficiente para irem aos frigoríficos) começou a diminuir. Junto a esse fator, o consumo está altíssimo, principalmente no exterior. Ou seja, com a oferta caindo e a demanda aumentando, os preços sobem. A relação entre o dólar e o Real também favorecem as exportações, que passam a ser mais atrativas para os pecuaristas.
Em 2024, o Brasil abateu em torno de 38,6 milhões de cabeças de gado para atender essa demanda. No final do ano, os pecuaristas começaram a abater vacas para atender a demanda. Isso quer dizer que conforme os meses avançam, o número de animais disponíveis para o abate diminui, e os preços sobem mais.
E o que o clima tem a ver com isso? Em 2024, a estiagem que atingiu o país fez com que os pastos ficassem mais empobrecidos. Para compensar essas perdas, os pecuaristas precisam investir em suplementação alimentar (ração e suplementos) para o gado continuar ganhando peso, ou em confinamentos. Esses fatores elevam o custo de produção da carne e o valor, é repassado ao consumidor.
Já o preço da ração para animais de grande porte varia de acordo com os preços das commodities milho e soja, principais ingredientes das rações.
Para 2025: a tendência é que os preços da carne bovina continuem subindo ao longo do ano, com a oferta de animais se reduzindo mês a mês. A pecuária é uma atividade de ciclo longo e a reposição de animais é lenta: as matrizes (vacas) precisam gerar novos bezerros, que levam em torno de dois a três anos para chegar ao peso ideal para o abate. Até o final de 2027, a carne deve permanecer mais cara.
- Leite: a produção de leite é realizada, em sua grande maioria, em sistemas intensivos: as vacas leiteiras não ficam soltas no pasto, mas confinadas em galpões e recebem alimentação em cochos (feno e ração), o que eleva o custo de produção. Os preços do leite variam conforme as variações registradas nos principais itens que compõem as rações, como o farelo de soja e milho. No entanto, ondas de calor provocam estresse em vacas e a produção, naturalmente, cai.
Na região Sul, o setor leiteiro sofreu prejuízos consideráveis devido às enchentes.
- Etanol e açúcar: o Brasil começou o ano com grandes expectativas de uma safra enorme, mas a estiagem e também, as queimadas que atingiram os canaviais de São Paulo, que é a principal região produtora de cana-de-açúcar fez a produção cair e prejudicou, também, a produtividade das lavouras. Por isso, o preço subiu.
Para 2025: a preocupação está no campo, já que as queimadas que ocorreram nos canaviais podem prejudicar a produtividade dos canaviais ao longo das próximas safras. No entanto, a produção de etanol a partir de outras matérias-primas como o milho ou bagaço de celulose, podem ajudar no equilíbrio de preços do biocombustível, mas não do açúcar.
- Frutas e hortaliças: são produtos mais sensíveis, que refletem mais rápido as mudanças climáticas. Plantações de frutas como a laranja, por exemplo, estão concentradas em São Paulo e Minas Gerais, estados que tiveram fortes estiagens no ano. A seca prejudicou a produção, que caiu. Além disso, o Brasil enfrenta um problema chamado Greening, que é uma doença que exige erradicação das árvores e a produção vem caindo. Países como Estados Unidos também enfrentam o Greening.
A laranja pera acumulou uma alta de 48,33% no ano.
Já em regiões produtoras de frutas como o Vale do São Francisco, o que impacta o custo de produção em épocas de estiagens são os valores da energia elétrica. Outro insumo que pesa no custo de produção são os fertilizantes, que são, em sua maioria, importados.
As hortaliças sentem as adversidades climáticas na hora. Durante todo o período de estiagem, os produtores precisaram lançar mão de tecnologias como a irrigação, que elevam o custo de produção. Mas, com a seca, a conta de energia elétrica (essencial para os sistemas de irrigação) também entrou na conta de alta de preços.
Para 2025: a produção no campo deve depender diretamente das condições climáticas em cada período do ano, já que hortaliças e a maior parte das frutas são cultivos de ciclo curto, que levam em torno de 90 dias para serem plantadas, desenvolvidas e colhidas. Nas próximas semanas, por exemplo, as melancias devem chegar ao mercado com preços bem atrativos e condições ótimas, mais doces e mais bonitas. Isso deve ocorrer por que o clima ajuda a produção.